20 Versões "Rockers" de Músicas Natalinas.

It's Christmas Baby!




Desejo a todos um Natal de Paz,
e que em 2012,
A humanidade seja mais humana.





Brian Seltzer Orchestra - Jingle Bells (2010)

B.B. King - Christmas Celebration (2007)

Joe Satriani - Silent Night (1997)

Queen - Thank God It's Christmas (1984)

Geoff Tate - Silver Bells (2008) 

Elvis Presley - Santa Claus Is Back In Town (1957)

Slade - Merry Xmas Everybody (1994)

Jeff Beck - Amazing Grace (1997)

Paul Di'Anno - Silent Night (1996)

Halford - Oh Holy Night (2009)

Tuff - Jingle Bell Rock (2003)

Lynyrd Skynyrd - Christmas Time Again (2000)

Twisted Sister - Let it Snow (2006)

Bob Dylan - Winter Wonderland (2009)

Joe Perry - Blue Christmas (1997)

Reo Speedwagon - Joy To The World (2008)

Jethro Tull - Another Christmas Song (2003)

Snow Patrol - When I Get Home For Christmas (2000)

The Dandy Wharols - Little Drummer Boy (2000)

Teenage Fanclub - Christmas Eve (2000)


A Igreja Australiana

Muito Além da Via Láctea




Algumas bandas são mais conhecidas por uma música, por um hit, do que propriamente por seus nomes. São as chamadas one hit band, que em bom português significa ‘banda de um sucesso só’. Entre essas bandas destacam-se Spandau Ballet (True), Europe (The Final Countdown – adorada pelos técnicos de som de cerimoniais), The Housemartins (Build – quem não se lembra do papapa papel...), Chris Isaack (Wicked Game), 4 Non Blondes (What’s Up), só para citar algumas. Para mim, esse rótulo soa um pouco generalista, comumente usado por aqueles que escutam música apenas pelo rádio. Grande parte desses nomes citados possui trabalhos interessantíssimos, é o caso dos australianos do The Church.

O The Church surgiu em Sydney no inicio da década de 80, quando o AC/DC já era um monstro sagrado do heavy metal, e as bandas Midnight Oil, INXS e Men at Work consolidavam de vez a Austrália no cenário da música mundial. Os primeiros trabalhos do Church certamente foram ofuscados pelos conterrâneos de maior sucesso, mas em 1988, com o álbum Starfish, a banda deixou todos eles para trás, graças à segunda música do disco: “Under The Milky Way”. A canção chegou ao Top 30 no seu país de origem, apareceu em segundo lugar no Billboard Mainstream Rock Tracks – ranking da revista americana que indica as músicas mais tocadas nas rádios dos Estados Unidos –, ficou entre as 100 mais tocadas no Canadá, na Inglaterra e em vários outros países, inclusive no Brasil, além de ser eleita pelos australianos a melhor canção dos últimos 21 anos.



Mesmo que até hoje, “Under The Milky Way” continue tocando nas rádios e também é figura frequente nos vídeos da madrugada na MTV, a obra do The Church é muito maior do que essa canção. Starfish é um disco maravilhoso, talvez o melhor, mas é apenas o décimo trabalho da banda, e discos anteriores como, o primeiro, Of Skins And Heart (1981), The Blue Crusade (1982) e Heyday (1985) também têm em seus repertórios pérolas como a incansável “Under The Milky Way”.



Fundada pelo baixista e vocalista Steve Kilbey e pelos guitarristas Peter Koppes e Marty Wilson-Piper, o The Church nasceu em meio ao movimento pós-punk que dominou o início da década de 80, na mesma onda de bandas como, The Cure, Echo & The Bunnymen e U2. A peculiaridade do som do Church é que mesmo sem ter tecladista, suas músicas são recheadas de camadas sobrepostas de guitarras, com timbres e afinações diferentes, alternando entre rifss e efeitos repletos de psicodelia, bem próximo ao rock progressivo, sem perder o frescor da música pop.

Entre coletâneas, discos ao vivo e álbuns de estúdio, a banda, que continua na ativa, já lançou mais de 30 discos, e em cada um deles tem pelo menos uma “música-que-gruda-no-ouvido-à-primeira-ouvida” como “Under The Milky Way”. Além do hit-chiclete, compartilho com vocês músicas de outras épocas da banda, e, claro, as melhores do fabuloso Starfish.   




"Under The Milky Way" (Starfish - 1988)



"The Unguarded Moment" (Of Skins And Heart - 1981)



"Field Of Mars" (The Blurred Crusade - 1982)



"Tristesse" (Heyday - 1985)



"Lullaby" (Sometime Anywhere - 1994)



"Snowfaller" (Back With Two Beasts - 2005)



"A New Season" (Starfish - 1988)



"Destination" (Starfish - 1988)



"Sparks" (Starfish - 1988)



"Antenna" (Starfish - 1988)



"Lost" (Starfish - 1988)


I'm Too Old Too Rock'n'Roll





Dias atrás eu estava fazendo uma limpeza no meu PC e encontrei algumas entrevistas e matérias da época da faculdade, e no meio de tantos arquivos inúteis, encontrei a entrevista que eu fiz com um cara que tem uma história e tanto para contar. Robson Goulart é produtor executivo de shows e já viajou o mundo trabalhando para algumas das maiores bandas de rock. Eu o conheci no final da década de 90, assim que ele chegou a Campo Grande, e desde o primeiro contato me impressionei com a sua carreira profissional. Impressionou-me ainda mais saber que um cara com a sua experiência e capacitação tinha dificuldade de trabalhar em Mato Grosso do Sul. Então, resolvi compartilhar com vocês essa entrevista onde ele conta um pouco da sua profissão, da sua história e da sua carreira como vocalista. 





Robson Goulart de Oliveira é produtor executivo, produtor de palco, tour manager e diversos outros termos que dá nome a sua profissão. Na verdade, ele é o cara que faz o som rolar redondo no palco. A abrangência da sua função vai desde o translado dos músicos até a montagem e iluminação do palco. Nos seus 47 anos de vida, Robson passou quase trinta viajando com grandes artistas da música internacional, como Rolling Stones e A-ha, e com nomes nacionais de peso que é o caso da dupla Zezé di Camargo e Luciano.

Paulistano, Robson teve seus melhores momentos como produtor na terra da garoa. Mudou-se para Campo Grande no final de 1999 onde trabalhou com algumas duplas sertanejas. Na entrevista abaixo ele fala com alegria da sua profissão e das suas viagens, confessa uma certa mágoa com a inexperiência e a falta de profissionalismo dos produtores culturais da capital. Robson fala ainda da sua carreira de músico e do sonho de trabalhar com um grande artista sul-mato-grossense.

Pouca gente conhece a sua profissão. Qual seria exatamente a função de um produtor de palco?

Na verdade eu sou produtor executivo, e dentro da profissão tem várias funções ligadas a ela. Eu faço a parte de projetar um palco para um evento que me for requerido e depois faço a execução do mesmo, como montagem de palco e cenário. Isso é mais conhecido como stage production. Também sou iluminador e ligth designer, onde faço o projeto de iluminação e executo o projeto de montagem. Na parte de produção eu também faço o contato entre o contratante e o contratado para organizar o show, o translado, hospedagem, alimentação e horários do trabalho. Tudo isso juntamente com a equipe em que irei trabalhar.



Robson em frente a bateria do Mike Portnoy (Dream Theater)



Você é paulistano e começou sua carreira lá. É notória a produção cultural de São Paulo. E aqui em Mato Grosso do Sul, especificamente na capital, existe muito espaço para a sua área?

Existe, mas ainda é um pouco complicado. Quando eu cheguei aqui em Campo Grande, em meados de 99, era muito difícil trabalhar nessa área. Eu me lembro bem que havia muito pouca mão de obra especializada nessa área. Mas a maior dificuldade que eu senti foi que as pessoas que estavam nesse setor não deixavam você entrar no circuito. Isso ainda acontece, mas tem melhorado bastante, pois, se não houver uma abertura de colaboração profissional não tem como crescer o trabalho. Com o tempo estão acontecendo algumas melhoras gradativas, mas isso está sendo alcançado devido a alguns empresários que estão buscando aprimorar o setor profissional e cultural no Mato Grosso do Sul.  


Robson e Matthias Jabs, guitarrista do Scorpions


Você trabalhou com vários nomes importantes da música internacional e nacional. Cite alguns dos mais significativos.

Realmente eu tive a grata oportunidade de trabalhar com vários artistas tanto internacionais como também nacionais. Eu me lembro que quando me interessei pelo trabalho tive a oportunidade de iniciar com grandes nomes de produtores internacionais como Jake Barry, que na época já era um dos grandes stage productions mundiais, e eu trabalhei com ele na produção dos shows do Metallica e Rolling Stones. Também fiz trabalhos com outras bandas como Dream Theater, Motorhead, Yngwie Malmsteen, A-há e Information Society, entre outros. Na parte nacional eu fui produtor da dupla Zezé di Camargo e Luciano, Fafá de Belém, também fui tour manager da banda Angra. Tive a grata oportunidade de trabalhar com a Cássia Eller aqui em Campo Grande na última vez em que ela esteve aqui, fazendo a produção de palco para sua equipe. Trabalhei também com Leandro e Leonardo como assistente de produção. Também não poderia deixar de mencionar que trabalhei com alguns artistas sul-mato-grossenses como Marco Aurélio e Paulo Sérgio, Jads e Jadson e João Bosco e Vinicius entre outros.


Robson e Klaus Meine, vocalista do Scorpions. Ao fundo, o guitarrista Rudolf Schenker entornando certamente algo etílico


Hoje você já não trabalha com shows. Há quanto tempo você deixou os palcos e por quê?

Já tem mais ou menos uns dois anos que deixei de trabalhar na área. Primeiro porque eu precisava estar mais próximo a minha família, já havia algum tempo que eu precisava estar mais presente, principalmente porque temos um filho pequeno e ele precisava na época de maiores cuidados. Segundo porque eu tive algumas decepções profissionais aqui no estado por trabalhar com algumas pessoas novas na área e que ainda não são suficientemente capazes de exercer funções nas quais estão trabalhando. Isso infelizmente gerou uma insatisfação muito grande em mim, e me fez ser mais seletivo para com as pessoas que eu possa trabalhar e levar o meu conhecimento profissional.


Robson cantando com a banda Harppia


Você também é músico. Qual foi o seu melhor momento na música?

São muitos. Eu na verdade tenho muitas boas lembranças de shows e convites para participar de shows, acredito que o melhor momento ainda está por vir. Se for falar em época, acredito que foi a década de 90 inteira, pois tive várias oportunidades de cantar e gravar materiais que inclusive estão arquivados. Mas já houve alguns contatos com pessoas que estão interessadas em lançar um material inédito no mercado. Talvez ainda esse ano.


Robson com a banda Acid Storm


Existe alguma previsão em voltar a tocar?

Então, como eu disse anteriormente, tive alguns contatos com músicos que já havia trabalhado em São Paulo. Surgiram alguns convites de participar de bandas e projetos, não posso dizer para quando, mas tenho esse projeto em minha vida para médio ou curto prazo.


                                               Robson  em ação com a banda Acid Storm


E voltar a trabalhar como produtor de palco? Existe alguma possibilidade?

Sim existe. Inclusive eu estou querendo voltar a trabalhar nessa área em breve. Não sei se será aqui ou em São Paulo, vai depender de alguma boa proposta, tanto aqui como por lá. Eu sou fã incondicional de um artista aqui do Mato Grosso do Sul, o Almir Sater. E se um dia tiver a oportunidade de conhecê-lo serei muito grato, e seria mais honrado ainda se pudesse trabalhar com ele.


Robson e o baixista Rudy Sarzo (Ozzy Osbourne, Whitesnake, Quiet Riot e Dio)


Você deve ter presenciado algumas situações interessantes nos bastidores nesses anos todos em que trabalhou com shows. Tem alguma especial que você possa contar para a gente?

Eu costumo dizer que nesses 27 anos de profissão tive tantas situações boas como difíceis, e também algumas engraçadas. A partir do ano que vem devo escrever um livro sobre minhas experiências nos back-stages em que eu estive. Mas tenho uma que desde que comecei a trabalhar nessa área me ensinou muito de como devemos ser nessa minha profissão. A banda Oingo Boingo veio fazer uma turnê pelo Brasil e nós estávamos fazendo os shows de São Paulo, no ginásio do Ibirapuera. O empresário local que havia comprado as datas, chegou meia hora antes do show começar e foi ao portão de acesso aos camarins. Chegando ao portão ele tentou entrar, mas foi barrado pelo segurança, pois a ordem era de ninguém entrar se não estivesse credenciado, e essa ordem foi dada pelo próprio empresário. Nessa mesma hora eu estava do lado de fora e vi a cena toda, foi muito engraçado eu ver o empresário dizendo em voz alta: “eu sou o cara que está fazendo esse show, quem é você para não me deixar entrar?” O segurança respondeu que ele era o segurança e a ordem vinha de seus superiores, e ele não deixaria passar nem o Papa sem credencial. Foi quando ele me viu e pediu prá chamar um dos sócios dele lá dentro para resolver a situação. Eu até tentei fazer o segurança o deixar entrar, mas ele foi irredutível em dizer que não entrava ninguém sem credencial. Aprendi desde então que devemos ser sempre humildes e educados com todas as pessoas que estão trabalhando em sua volta, e que regras são feitas para serem obedecidas por todos sem distinção de cargo ou poder.


Robson com Zezé di Camargo e Luciano


Você viajou o mundo inteiro como produtor de shows. Qual foram os lugares mais interessantes que você conheceu?

Já viajei bastante mesmo. A Europa é o mundo velho, tem muitas histórias e locais fascinantes. A Ásia é o futuro misturado com a antiguidade, é muito louca a cultura milenar exercendo fortes impactos na cultura tecnológica. Mas a maior experiência que eu já tive foi em conhecer o nosso país, em cada estado uma cultura diferente e ao mesmo tempo sendo ligada por costumes e tradições. Costumo dizer que antes de alguém querer conhecer lá fora, conheça o nosso Brasil, ele é rico e imenso, tanto em cultura como em divisas, é onde tive muitas experiências incríveis e interessantes. Vale muito à pena conhecer o nosso país. Você começa a descobrir porque o mundo inteiro está interessado no Brasil, aqui realmente é o celeiro do mundo, pena que o próprio povo não se dê o devido valor.




"Filhos dos Livres Pensamentos" - Capítulo 3





Dando continuidade as postagens de partes do livro que escrevi, como tese de conclusão de curso, sobre os músicos Guga Borba e Guilherme Cruz. Neste capítulo, dedicado ao Guilherme, conto o seu interesse precoce por um instrumento musical, as suas aventuras e aprendizados nos Estados Unidos, e, claro, a parceria com o Guga. Volto a lembrar que esses são apenas alguns trechos do livro que, quiçá, um dia eu consiga publicar. Lembro também que os capítulos anteriores estão nas postagens antigas.






Capítulo 3













“Noite de chuva, é isso que sou
Misturo Neruda com Rock n’ Roll...”
Paixão Minha (Guilherme Cruz) 





Enquanto Curitiba sofria com o rigoroso inverno em 1975, a Santa Casa de Campo Grande padecia com problemas de infecção hospitalar. Foi por isso, e só por isso, que Guilherme Silva Cruz nasceu no Rio de Janeiro. Precisamente, no dia 12 de julho de 1975, na cidade de Volta Redonda. “Minha mãe foi só para eu nascer, depois de um mês viemos para Campo Grande. Foi por uma questão clínica mesmo”.

            Seus pais, Fernando Manuel Garcia Cruz e Maria Helena Silva Cruz, vieram do Rio de Janeiro para Campo Grande em 1974. Guilherme é o mais velho do casal de irmãos, a caçula, Fernanda, é três anos mais nova. Até os dois anos, Guilherme morou na Rua Maracaju quase esquina com a Rui Barbosa, depois se mudou para a Rua José Gomes Domingues, no bairro Santa Fé. Foi onde o violão entrou como um “remédio” na sua vida.

            Guilherme era uma criança muito agitada, dava muito trabalho para seus pais. “Eu era terrível”. Diagnosticado como uma criança hiperativa, o médico indicou uma série de remédios, mas, Dona Maria Helena preferiu adotar um tratamento alternativo: usar o violão como remédio.

            — O médico queria me dar remédio, mas a minha mãe não enxergou dessa forma. Ela foi muito feliz em não acreditar nisso. Quando eles me deram o violão, o problema acabou. A minha energia foi toda para ele. Eu ficava tocando o dia inteiro, ai meus pais me arrumaram um professor de violão.

Guilherme “mergulhou” no violão. Ele não sabia se isso era bom ou ruim, só queria aprender a tocar. “Esse era o meu barato, conseguir tocar”. Guilherme ganhou o violão no Natal de 1982, logo no começo do ano seguinte foi estudar com o músico Carlos Colman.

            Colman ensinava muitas músicas de compositores regionais para o pequeno Guilherme. Desde cedo, teve contato com o trabalho de Geraldo Espíndola, Almir Sater, entre outros. Dentre essas músicas, aprendidas quando ainda era uma criança, uma canção da banda Olho de Gato cruzaria o caminho do Guilherme, vinte anos mais tarde, dentro de um estúdio.

            — Quando eu estava produzindo o CD do Olho de Gato, eu contei para o Bola – baterista do Olho de Gato – que quando eu tinha dez anos de idade eu tocava uma música dele. Peguei o violão e toquei. Cara! Ele chorou. Tudo isso porque o Carlinhos me passava essas músicas.

            Depois de dois anos estudando violão, Guilherme subiu em um palco pela primeira vez. Em 1984, Carlos Colman tocou em um festival de rock realizado no Horto Florestal, junto com a banda Alta Tensão e o cantor Simona. Carlinhos convidou Guilherme para tocar uma música junto com ele no show. O guri não amarelou, levou uma fita com a música “Casa velha” para estudar em casa.

            — Eu lembro com detalhes desse dia, lembro claramente do show. Lembro até que acabou a luz. A banda do Carlinhos era o Bosco na bateria, o Edinho e o Orlando Brito nas guitarras, só não lembro quem era o baixista. No meio do show ele me chamou, eu subi lá e cantei...

...Guilherme se interessou pela guitarra quase que ao mesmo tempo em que absorvia as suas primeiras referências musicais. Desde muito novo, ele teve contato com os discos dos seus pais. Os seus preferidos eram Tim Maia, Ivan Lins e Ney Matogrosso. Mas com sete anos, Guilherme conheceria a banda que mudaria sua vida.

            Nessa época, uma moça de Bataguassu trabalhava na casa de Guilherme. Leonice gostava de rock, e foi ela a responsável por mostrar essa nova “seara” da música para o pequeno Guilherme. Quando seus pais saiam, os dois ficavam ouvindo os discos que ele gostava na coleção de seu pai. Um belo dia Leonice fez a pergunta fatal: “Você tem Kiss ai?”

            — A gente ficava ouvindo Tim Maia e Ivan Lins, ai um dia a Leonice me perguntou se eu tinha Kiss. Cara! Kiss? Ela me mostrou e eu fiquei doido, aqueles caras tocando guitarra... Eu achei aquilo do caralho.

            Se Guilherme já gostava da música regional que aprendeu com Carlinhos e da MPB dos discos do pai, quando conheceu o rock, conseguiu assimilar bem toda essa diferença de influências.

            — Eu consegui fazer bem essa mistura. Eu gostava do Tim Maia e do Ivan Lins, mas também gostava do Geraldo Espíndola e do Almir Sater. E gostava do Kiss. Foi assim até eu ir fazer aula com o Edinho. Quando eu tinha 13 anos eu desliguei de música regional e de MPB. Comecei a fazer uma pesquisa “rock’n’roll”. Depois do Kiss, a Leonice me mostrou o “Hot Space” do Queen. A influência musical dela acabou ai, depois eu corri atrás.

Depois do Kiss e do Queen, Guilherme descobriu por contra própria AC/DC e os Beatles. Começou a ouvir tudo que aparecia em suas mãos, mas as bandas realmente fizeram a sua cabeça, Guilherme mergulhou a fundo em suas obras.

— Eu queria ouvir tudo, conheci os Beatles com 14 anos e fiquei doido. As bandas que eu gosto, eu realmente entrei no material. Rolling Stones, por exemplo, eu sei pouca coisa, já Kiss, AC/DC, Queen e Beatles eu sei tudo. Se eu pegar uma guitarra eu toco quase tudo do Kiss.

A importância dos pais na carreira musical de Guilherme vai além da sábia ideia de trocar o tratamento médico pelo violão. Seus pais sempre incentivaram a sua música. Quando Guilherme ainda fazia aula com Carlos Colman, ele ficava sabendo de todos os shows que aconteciam em Campo Grande, e seus pais tinham que levá-lo, gostassem ou não.

— Meus pais me levavam nos shows. Eles ficavam doidos, mas me levavam. Eu lembro que teve um show do Alta Tensão em uma escola, e eu e minha mãe tivemos que pedir informação para achar a escola. Acho o maior barato isso neles.

Guilherme nunca teve problemas em casa por causa da música. Ao contrário, sempre teve muito apoio. Boa parte disso se deve ao equilíbrio que Guilherme fazia entre a música e os estudos. Ele não mudou a sua rotina por causa da música. 

Além de estudar, Guilherme também fazia natação no Rádio Clube – onde conheceu dois futuros parceiros musicais: Fábio “Corvo” Terra e Marcelo Pettengill.
Apesar dos estudos e da natação, continuava a estudar música, mas, sem muitas pretensões. Na verdade Guilherme nunca pensou em ser músico, o instrumento era apenas uma conseqüência.

— Eu nunca pensei em largar os estudos para ser um “rockstar”, eu fazia tudo paralelamente. A música nunca foi o meu objetivo. Talvez por isso que eu nunca tive problema em casa. Mas eu tenho certeza que se eu falhasse nos estudos, certamente eu teria problemas. Mas como eu sempre fui equilibrado, só tive apoio...

...Guilherme estudou até a 2ª série do 1º Grau – atual 3º ano do ensino fundamental – na escola da professora Dolly, atualmente Alexander Fleming, depois foi para o colégio São Bento, onde conheceu os primeiros parceiros musicais. Foi estudando no São Bento que Guilherme teve a oportunidade de tocar a primeira vez com banda. E a sensação foi inesquecível.

— Quando o Corvo foi estudar no São Bento é que começou a brincadeira. Ele e o Deco tocavam direto na casa do Deco. Toquei algumas vezes com o Deco e Corvo lá, mas sem baixo. Em uma casa lá na Coopharádio, não sei de quem era, eu toquei guitarra com o Deco na bateria e o Alexsandro no baixo. Foi a primeira vez que eu toquei com banda. Foi igual perder a virgindade. Foi incrível!

Após sentir na veia o que é tocar com banda, Guilherme ficou viciado. Sabia que aquilo seria uma coisa importante na sua vida por muito tempo. “Eu realmente não tinha a intenção de ser músico, nunca planejei nada, as coisas aconteceram naturalmente na minha vida”.

Esses ensaios na casa do Deco seriam o embrião do futuro Inverno Russo, mas antes de efetivamente ser o guitarrista da banda, Guilherme tocou com a banda Outdoors.

— A época do Outdoors foi uma experiência musical interessante. Eles me procuraram e disseram que só tocavam músicas próprias, eu achei legal. Cheguei no ensaio e os caras tinham umas dez músicas próprias, eu só tinha que aprender a música e fazer os solos. Foi o meu primeiro contato com música autoral, isso foi muito bom para mim.

Depois dessa passagem pelo Outdoors, Guilherme voltou para o Inverno Russo, mas a experiência de tocar músicas autorais deixou um gostinho de quero mais. Tendo que lidar com um repertório basicamente só de covers, a vontade de compor e cantar suas próprias músicas começou a florescer.

— Na época do Inverno Russo eu não estava satisfeito em tocar cover. Meu prazer era tocar essas músicas no violão, para os meus amigos. Eu não estava a fim de fazer uma banda daquilo.

            A composição entrou na vida de Guilherme muito cedo. Desde que ganhou o primeiro violão, já tentava compor. Ele juntava os três acordes que conhecia e criava músicas instrumentais. “Eu brincava que eram as minhas músicas. Era uma brincadeira, mas eu sei até hoje, eu tenho essa brincadeira até hoje na minha cabeça”.

É dessa época também a vontade de escrever letras. Desde muito novo Guilherme gostava de escrever. Mas, ainda não tinha capacidade alguma de colocar música em cima. Foi aos 13 anos que ele fez o seu primeiro esboço do que seria uma música.

            — Eu fiz uma música em inglês e mostrei para o André – tecladista do Inverno Russo. O nome da música é “I need your eyes”. Ela tem uma cadência tipo Beatles porque quando eu fazia a 8ª série eu descobri os Beatles, aí percebi que dava para fazer música. O André tira o sarro de mim até hoje porque ele sabe o refrão. Kkkk!

            Quando tinha entre 15 e 18 anos, Guilherme diz que já compunha música de “verdade”. A sua primeira composição de “verdade” não tem nome. Seu primo até tentou balizá-la de “Restos mortais” – que faz parte do refrão – mas Guilherme achou horrível, até porque, a letra é bem romântica.
           
— Eu lembro exatamente da situação dessa música. Ela não foi feita para uma pessoa ou uma situação. Lógico que tem a “gasolina”, um incentivo do sentimento, mas não feita demonstrando uma situação. Não narrava uma história que estava acontecendo comigo na época, mas sim um sentimento que me levou pensar em uma letra. Eu a chamo de música de “verdade” porque ela já tem uma concepção de melodia...

...Guilherme não tem regra para compor. Às vezes, a letra vem antes e ele coloca música em cima, outras, o que vem primeiro é a melodia, e tem também aquelas que nascem prontas. Guilherme fez “Monocromo” – do disco “República dos Livres Pensamentos” – em 15 minutos. “Paixão minha” – do mesmo disco – nasceu inteira de uma vez. Como ele mesmo diz: “Foi vomitada”.

“Paixão minha” tem duplo sentido. A música traça um paralelo entre a geografia e uma paixão, ela pode falar de um lugar – Campo Grande – ou de uma pessoa. Guilherme gosta de deixar essa dúvida nas pessoas: “Fica essa questão no ar, essa é a onda da música”. Mesmo cheia de enigmas, a música tem várias referências explícitas à cultura regional.

            — Quando eu fiz essa música, a minha intenção era fazer um paralelo entre uma relação pessoal e uma cidade. “Não sei por que tiraram nossos trilhos paixão minha”, pode ser terminar uma relação ou os trilhos que foram tirados de Campo Grande. “Não sei por que enxergo tudo nas entrelinhas”, Campo Grande é cheia de entrelinhas culturais. “E terra boa dizia a menina um dia”, é uma referência clara da música “Terra boa” cantada pela Alzira Espíndola quando era uma menina. “Aqui o poeta bebia e do trem escrevia”, é o Paulo Simões. “E o parceiro voz rouca a todos dizia que austeridade demais só traz melancolia”, é o Roca, inclusive na música “Mais loucos do que a média” ele cita “austero demais”...

...Após concluir o 3º ano do segundo grau – atual 3º ano do ensino médio – Guilherme decidiu investir nos seus estudos musicais. Deixou o Inverno Russo e foi para os Estados Unidos estudar guitarra. Aos 17 anos, Guilherme mudou para Los Angeles e se matriculou no GIT (Guitar Institue of Technology).

            O GIT entrou na sua vida como a música, por acaso. Guilherme já conhecia a escola e até tinha o livro com as informações para se matricular, mas estudar fora não era o seu projeto. Ele estava inscrito no vestibular para Engenharia Elétrica na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), iria seguir com a vida estudantil, até que o encontro com um famoso guitarrista mudou seus rumos.

            — Se eu tivesse feito faculdade nessa época, eu estaria formado com 22 anos. Poderia ter sido uma vida bem diferente. Eu ia fazer vestibular para Engenharia Elétrica. Imagina! Sei lá porque Engenharia Elétrica. E com 17 anos a gente sabe alguma coisa? Com essa idade a gente não sabe do que gosta.

            Em 1991, Guilherme participou de uma clínica de guitarra ministrada pelo músico Tomati, guitarrista da banda do Jô Soares. Antes de começar a clínica, Tomati se apresentou dizendo que era guitarrista profissional formado no GIT. Após se impressionar com a técnica do guitarrista, Guilherme viu ali um sinal. “Poxa! Eu já tenho o livro do GIT, vou falar com ele”.

            — Depois de ver o “absurdo” que ele tocava, eu fui falar com o Tomati. Perguntei para ele como era morar lá, como era a escola... Ele me deu a maior força. Disse que era tranquilo, que eu iria encontrar ajuda fácil por lá. Foi um ponto decisivo para eu ir. Eu senti firmeza. Era real. Então fui falar com meus pais. 

            Mais uma vez, Guilherme recebeu total suporte e apoio dos pais. Eles também acreditavam que o filho deveria continuar estudando música. “Acho que eles visualizavam uma carreira”. Em fevereiro de 1992, Guilherme se mudou para L.A.

Mesmo ciente que seu estudo musical era muito pouco para o que iria encontrar em Los Angeles, Guilherme levou um choque. Descobriu que tocar bem é muito mais do que saber tocar e solar. Um professor disse que ele teria que mudar o jeito de palhetar, outro alertou que o seu Bend era tecnicamente muito ruim. Guilherme teve que reaprender a tocar guitarra.

            — Eu comecei a tocar guitarra do zero. Caí na real que a música é muito além, você começa a estudar hoje e quando estiver com 70 anos ainda está aprendendo. Aí eu relaxei, música é só aprender. Eu comecei a fazer os exercícios do zero, só que com 18 anos e podendo estudar oito horas por dia.

            O GIT tem um sistema de ensino que obriga o aluno a conhecer vários estilos musicais. Existem as aulas teóricas, que são obrigatórias, em sala com vários alunos, e as eletivas, as quais a escola escolhe um professor específico para as aulas privativas. É o aluno que monta a sua grade e o seu currículo, desde que cumpra o número determinado de horas para se graduar. Com muito tempo para estudar e ótimos professores a disposição, Guilherme pôde aprender com excelentes músicos, e alguns, bem famosos.

            — O meu professor obrigatório e particular, que eu tinha uma hora por semana, era um cara de jazz, Dave Hill, o cara era fera, muito bom, mas a minha praia era rock’n’roll. Eu tive a oportunidade de estudar com o Paul Gilbert – guitarrista da banda Mr. Big – que era muito famoso na época. Eu consegui assistir aula dele com mais cinco alunos na sala, isso não tem valor. Você vê que o cara existe e que é simples como todo mundo. Porra! O cara é um megastar e esta aqui na minha frente dando aula de chinelo. Nessa escola você aprende de tudo, até a respeitar um músico.

Guilherme se dedicou muito aos estudos, mas sem deixar de aproveitar o que Los Angeles tem de melhor: a vida cultural. A maioria dos seus amigos gostava de aproveitar o fim de semana para viajar para Las Vegas ou San Francisco, Guilherme preferia gastar seu dinheiro com shows.

— Los Angeles tem uma infinidade de coisa para ver e conhecer. Eu assisti vários shows, assisti tudo que eu podia. Eu fui aos shows do Van Hallen, Aerosmith, Extreme, Scorpions, Living Colour, Vince Neil… vários. O primeiro que eu assisti foi o Bon Jovi, na turnê Keep The Faith, com dois dias de Califórnia.

            Guilherme comemorou seus 18 anos em Los Angeles. Como tinha algum dinheiro guardado e podendo tirar carteira de motorista, comprou um carro, um Fox – similar ao brasileiro Voyage. Devidamente motorizado, começou a rodar pela cidade e a conhecer pessoas fora da escola. Foi em uma dessas andanças que Guilherme encontrou a oportunidade de tocar em uma banda.

            — Eu fui assistir o Kiss colocar as mãos no Rock Walks Guitar Center , aí eu vi um cartaz colado em um poste. O cartaz dizia que a banda procurava um guitarrista com as mesmas influências minhas. Aí eu pensei, eu sou esse cara.

            Guilherme fez o teste, passou, e entrou para o Billionaire Boys Club. A banda tinha um visual semi-glam, com um som tão pesado quanto à maquiagem. Com o Billionaire, Guilherme passou a frequentar o circuito de shows da Sunset Strip.
Bares como o Rainbown – onde o Guns’n’Roses gravou o clipe de “November rain” – o Roxy, o Whiskey a Go Go e o The Troubador liberavam a entrada para as bandas que queriam divulgar seus trabalhos. Foi em uma dessas noites de divulgação que Guilherme ficou amigo do porteiro do Whiskey, de uma forma bem inusitada.

— A gente saía para divulgar a banda nesses bares. Um dia nós chegamos ao Whiskey, todos maquiados, e o porteiro pegou o nosso flyer para conferir e disse em português: “mas que bichinha”. Eu falei: “bichinha é você seu viado”, ele morreu de rir. “Porra! Você é brasileiro”. Depois disso a gente ficou amigo, e mesmo que eu não fosse para divulgar a banda eu entrava de graça.

            Nessa época, a banda Red Hot Chilli Peppers estava procurando substituto para o guitarrista John Frusciante, e para isso, resolveu realizar um teste aberto ao público. Qualquer pessoa poderia fazer o teste, era só marcar o dia e a hora. Guilherme decidiu tentar a sorte, chegou até a ir ao local, mas desistiu.

            — Tinha um amplificador Marshall, uma câmera de vídeo, uma pessoa te direcionando, e só. Eu não cheguei a gravar, demorou muito. Eu fui embora senão perderia minha carona com o Marcelo Gomes...

...Em 1994, os Estados Unidos sediaram pela primeira vez a Copa do Mundo de futebol. Certamente, qualquer brasileiro amante do futebol, daria tudo para estar nos Estados Unidos, mas o vascaíno Guilherme fez o caminho inverso. Enquanto Romário construía o tetracampeonato para o Brasil, Guilherme voltava para Campo Grande.

            — Eu estava lá e vim embora, imbecil né? Por isso que a passagem estava barata. Kkkk! Mas, na verdade, eu não queria ficar, até porque, se eu ficasse para a Copa ia gastar mais dinheiro.

            Guilherme voltou ao Brasil com uma certeza em sua cabeça, ele já sabia o que queria fazer. “Eu queria acertar as coisas e ir para São Paulo”. Assim que chegou a Campo Grande, Guilherme se juntou novamente ao Inverno Russo, só que esse “novo” Inverno Russo tinha outra proposta.         A intenção da banda era apostar em um hard rock com letras sarcásticas.

            — A gente tocava hard rock, podia escrever em inglês, mas para que inglês? Se a gente gosta, vamos escrachar. A influência veio do Ultraje a Rigor, que falava das meninas de uma forma irônica.

            A banda tinha a intenção de trabalhar essas músicas em São Paulo, mas um problema envolvendo a “marca” Inverno Russo, catalisou essa ideia. Sem poder usar o nome Inverno Russo, Guilherme, Guga e o baterista Deco foram batalhar esse trabalho em São Paulo no início de 1995. Agora como Belladona.  

            Guilherme voltou dos Estados Unidos em julho de 1994, no começo do próximo ano já estava morando em São Paulo. Ele só voltaria a morar em Campo Grande em 2000...

...Após o fim do Belladona, Guilherme não voltou para Campo Grande, de São Paulo foi de novo para Los Angeles. Não sabia ao certo o que faria na sua segunda vez nos Estados Unidos. Quando chegou, descobriu que iria estudar áudio no RIT (Recording Institute of Technology).

            Se na primeira ida aos Estados Unidos Guilherme teve todo o custo bancado pelos pais, dessa vez foi um pouco diferente. Ele vendeu todo o seu equipamento musical e o seu carro, e em agosto de 1998 partiu para Los Angeles.

            — Dessa vez não foi tão “paitrocinado”, eu tive ajuda sim, mas foi diferente. Eu era mais maduro, segurei mais. Assisti muito menos shows do que na primeira vez.

            Assim que chegou em Los Angeles, Guilherme foi morar com o ex-companheiro do Billionaire Boys Club, Johny Ventura. Johny e outro músico, o baterista Rob Jones, convidaram Guilherme para dividir uma casa no Valley – Distrito de Los Angeles. “Topei na hora, os caras eram muito legais”. Como a RIT é em Hollywood, bem longe do Valley, Guilherme comprou um carro – uma BMW 320I, ano 1984, por 2700 dólares.

.           A escola oferecia dois horários para as aulas: diurno e noturno. Guilherme primeiro estudou de dia, mas logo mudou para o período noturno. “Eu funcionava muito melhor à noite”. Os alunos do período diurno tinham influências diferentes dos da noite. Estudando nas duas turmas, Guilherme teve a oportunidade de ter contato com pessoas de vários lugares.

            — Quando eu estudava de dia eu conheci a galera do RAP, o contato era totalmente outro. Aquele bando de “negões”, igual nos filmes mesmo, foi muito legal esse contato. Conheci colombianos, argentinos, europeus... Na minha turma da noite tinha um belga, um sueco, um argentino e um norte-americano. Foi uma conexão imensa, fiz amizades que tenho até hoje...

...Mas na sua segunda passagem por Los Angeles, nem tudo foi só alegria. Guilherme sofreu um acidente de carro a 150 km. Ele dirigia a sua BMW por uma freeway quando a roda do carro simplesmente caiu. Para piorar ainda mais a situação, o acidente aconteceu de madrugada, em um bairro mexicano barra-pesada – o mesmo bairro onde a banda Guns’n’Roses gravou o vídeo clipe da música “Welcome to the jungle”.

            — O pneu furou e foi esvaziando aos poucos, de repente a roda saiu. Imagina controlar um carro a 150 km sem roda? Kkkk! Ai eu parei em um posto de gasolina e pedi ajuda, o atendente nem saiu de dentro do caixa, me mandou seguir em frente. Cara! Eu trocando pneu de madrugada em um bairro mexicano de Los Angeles. A roda estava quente, eu não conseguia segurar. Foi uma situação horrível.

            Em 1999, Guilherme terminou seus estudos de áudio e voltou para o Brasil. Ele até cogitou a hipótese de ficar por um tempo indeterminado nos Estados Unidos, mas decidiu voltar. De Los Angeles, foi direto para São Paulo trabalhar em estúdio. Logo que chegou, Guilherme foi trabalhar no Estúdio 43, mais tarde, começou também a trabalhar no estúdio Midas.

No início, além de trabalhar com gravação, Guilherme também dava aulas de inglês. Como produtor, pôde trabalhar com artistas de vários estilos. No Estúdio 43, por exemplo, Guilherme gravou muito pagode.

            — Quando eu trabalhava no Estúdio 43 eu gravei muitos grupos de pagode. O Lino – saxofonista e flautista – do Negritude Jr. levava todas as suas produções para lá. Então, nem sei o número de grupos de pagode que eu gravei lá, foram muitos.

            Foi no estúdio Midas, do músico e produtor Rick Bonadio, que Guilherme pode trabalhar com artistas de ponta. Novamente gravou muito pagode, como os cantores Belo e Vavá, mas teve o privilégio de trabalhar como assistente de produção do disco “Isso é Amor” do IRA! e do “18 Anos Sem Tirar” do Ultraje a Rigor.

— Logo que eu cheguei no Midas eu peguei de cara o IRA! e o Ultraje. Porra! Eu trabalhava em um estúdio que só gravava pagode, graças a Deus que eu estou trabalhando aqui. Eu senti orgulho de estar trabalhando com uma coisa que eu gostava. Poxa, o Ultraje é referência, tenho raízes.

Porém, quando começou a trabalhar no Midas, Guilherme teve que se dedicar exclusivamente ao estúdio. Não conseguia mais dar aula de inglês e nem trabalhar em outros estúdios. Mas, o retorno financeiro compensava, com o salário que ganhava trabalhando no Midas, podia morar sozinho em um apartamento em Higienópolis, no centro de São Paulo.

            O hit “Tropa de Elite” da banda Tihuana, também passou pelas mãos e ouvidos de Guilherme. O disco que tem essa música – “Ilegal” – foi inteiro produzido no Midas. Outra produção importante foi com a dupla Sandy e Jr.. Guilherme participou de toda parte de overdub do disco “As Quatro Estações Ao Vivo”.

— O disco do Tihuana eu trabalhei desde o início, desde as demos . Foi muito legal, na verdade foi fantástico. O disco da Sandy e Jr. foi uma produção muito importante para mim. Foi uma das coisas mais legais que eu já fiz.

            Depois de cinco anos morando longe de casa, Guilherme voltou a morar em Campo Grande no ano 2000. Como fazia quando vinha de férias, Guilherme tocava com o Naip. O que dava imenso prazer ao Guga, que preferia ter o parceiro morando aqui na Capital. A sua intenção era ficar apenas por uns tempos, e depois retornar para São Paulo, mas, da mesma forma que o encontro com o Tomati levou Guilherme por outros caminhos, um convite à toa do amigo Dog mudou de novo o rumo da história.

            — Eu estava na academia com o Dog, malhando e batendo papo, aí ele me chamou para fazer vestibular para Administração na UFMS. Eu falei que não queria, mas ele insistiu, lembrando que era uma Universidade Federal. Acabei me inscrevendo no último dia das inscrições.

            Guilherme estava em Maresias – praia do litoral norte de São Paulo – quando saiu o resultado do vestibular. Ligou para a sua mãe e recebeu a resposta que já era esperada: “Imagina! Passou nada guri!”. Com a negativa no vestibular, Guilherme decidiu que era hora de voltar para o Midas. Afinal, trabalhando com estúdio em Campo Grande, ele nunca ganharia o que ganhava em São Paulo. Um mês depois, chega uma carta da faculdade dizendo que Guilherme havia entrado na segunda chamada.

            — Eram 50 vagas, eu fiquei em 54º. Aí eu tive que decidir se ficava em Campo Grande ou voltava para São Paulo. Poxa cara! Eu fiz o 3º em 1992 e passo no vestibular em 2000 em um curso que a concorrência era 26 por vaga? É muita sorte. Eu não ia perder a oportunidade de cursar uma Universidade Federal de graça. Então eu resolvi ficar. Eu me formei em Administração em 2004.

            Paralelamente à faculdade e a alguns trabalhos em estúdio, Guilherme era guitarrista da banda Naip. A proposta de repertório do Naip era o mesmo da primeira fase do Inverno Russo, mas Guilherme não queria mais tocar cover em festinhas. Ele queria trabalhar suas próprias músicas, chegou até a mandar um projeto de um disco solo para o FIC (Fundo de Investimentos Culturais).

            — Do repertório desse disco, algumas entraram no primeiro disco do Filho dos Livres, como “Numa outra estação” e “Não dá pra te esquecer”. O Filho dos Livres foi uma coisa natural. Eu não queria mais tocar cover...

            ...Assim como o Guga, Guilherme também está gravando um disco solo. Como o disco do Guga, o seu, não tem nada a ver com o Filho dos Livres. Enquanto o Guga está gravando um disco praticamente eletrônico, o disco do Guilherme é instrumental.

            — Eu já tenho quatro músicas escolhidas para o meu disco, e duas eu já comecei a gravar. O meu disco é instrumental e não tem nada a ver com o Filho dos Livres, tem a ver comigo. Eu não quero fazer um disco cantado. Apesar de ter várias músicas com letra que talvez, eu digo talvez porque eu não sei, não são músicas para o Filho dos Livres. Hoje eu não estou a fim de usar essas músicas, eu quero gravar um disco instrumental.

            Guilherme acredita que esses trabalhos paralelos ajudam na parceria com o Guga. Até por que, quando os dois sentam para trabalhar o Filho dos Livres, eles só focam esse trabalho. Os dois sabem muito bem diferenciar o que é trabalho de apenas tocar violão. Eles são muito profissionais quando o assunto é o Filho dos Livres.

            Para Guilherme, o terceiro disco de músicas inéditas do Filho dos Livres deve ser composto inteiro do zero. As músicas deverão ser feitas todas em parceria e dentro do conceito já existente do trabalho.

            — A gente não quer abrir o nosso baú de composições e pegar algumas músicas minhas e outras do Guga e vomitar um disco novo. O disco tem que sair como o Filho dos Livres tem que ser, dentro do conceito do Filho dos Livres. A gente já construiu uma discografia, é um trabalho que existe e é consolidado, então a gente não pode fugir disso.

            Devido aos trabalhos solos e as inúmeras ocupações de Guga e Guilherme, o Filho dos Livres está trabalhando com o repertório dos discos antigos. Esses discos solos refletem isso, que o Filho dos Livres não tem nada, por enquanto, que possa ser gravado e lançado.

            — A única coisa que a gente sabe do terceiro disco do Filho dos Livres é que ele vai ser feito do zero, igual ao “República dos Livres Pensamentos”. Mas para fazer isso, tem que estar no astral do que a gente quer fazer, e a gente não sabe ainda o que quer. Essa é uma fase de transição, acho até que nossos trabalhos solo refletem esse momento. E no momento, nós não temos nada de novo para o Filho dos Livres. A gente só vai fazer um disco novo quando a gente souber o que quer, só que ainda não encontramos o que quer fazer. O importante é fazer um disco que a gente queira fazer, que esteja fechado com o conceito da banda.